Razões
A vida é básica e sem muitos desdobramentos,
mas ainda mais curta e grossa, sem floreados ou enfeites é a morte. O marido
querido, pai de três filhos, no auge da carreira artística, cai no rio e é
preso em um redemoinho pra se afogar e morrer. Por quê? A gente fica tentando
encontrar razões para tragédias assim. O fato é que rios possuem redemoinhos
que podem nos puxar para baixo, a água inunda os pulmões e paramos de respirar.
Talvez todas as mortes no mundo tenham a mesma
causa que é dada por médicos quando não podem divulgar mais detalhes: morremos
de parada cardíaca e insuficiência respiratória. Sim. Morremos porque o coração
para de bater e nós paramos de respirar. Só isso e liquidamos todas as
explicações para a morte de alguém.
Achar razões para a morte parece ser pura perda
de tempo. Muito mais interessante é descobrir razões pra viver. Entre o pequeno
lapso de tempo entre o momento em que nascemos e a hora da morte, faz-se
necessário descobrir razões e motivos diários para experimentar, ainda que por
tão pouco tempo, aquilo que a vida generosamente nos oferece: piados na mata,
galinhas cacarejando, barulho de vento nas folhas, chuvas de verão e o pôr do
sol.
A vida é básica e as razões para vivê-la são
tênues. Elas nos escapam enquanto estamos muito preocupados em garantir o
futuro e evitar a morte. Paramos de beber isso, comer aquilo, fazer isso ou
aquilo. Tentamos evitar as doenças e fazemos exames preventivos para quase
tudo. Então, de repente, a morte chega em um redemoinho por baixo do rio calmo.
De alguma forma, vale a pena viver o dia e
deixar-se surpreender pela morte. A vida muda de repente. De uma hora pra
outra, o que era muito bom e essencial já não existe mais e temos que nos
reinventar. Há também momentos em que o que era ruim e deprimente já não tem
mais sentido e somos surpreendidos pela alegria.
Nós somos básicos e ao mesmo tempo complexos
como as razões para viver ou morrer. Talvez o que nos reste seja dignificar
esse breve intervalo em que temos a oportunidade de ouvir nosso coração bater e
encher nossos pulmões de ar.