terça-feira, 20 de setembro de 2016

Razões

A vida é básica e sem muitos desdobramentos, mas ainda mais curta e grossa, sem floreados ou enfeites é a morte. O marido querido, pai de três filhos, no auge da carreira artística, cai no rio e é preso em um redemoinho pra se afogar e morrer. Por quê? A gente fica tentando encontrar razões para tragédias assim. O fato é que rios possuem redemoinhos que podem nos puxar para baixo, a água inunda os pulmões e paramos de respirar.
Talvez todas as mortes no mundo tenham a mesma causa que é dada por médicos quando não podem divulgar mais detalhes: morremos de parada cardíaca e insuficiência respiratória. Sim. Morremos porque o coração para de bater e nós paramos de respirar. Só isso e liquidamos todas as explicações para a morte de alguém.
Achar razões para a morte parece ser pura perda de tempo. Muito mais interessante é descobrir razões pra viver. Entre o pequeno lapso de tempo entre o momento em que nascemos e a hora da morte, faz-se necessário descobrir razões e motivos diários para experimentar, ainda que por tão pouco tempo, aquilo que a vida generosamente nos oferece: piados na mata, galinhas cacarejando, barulho de vento nas folhas, chuvas de verão e o pôr do sol.
A vida é básica e as razões para vivê-la são tênues. Elas nos escapam enquanto estamos muito preocupados em garantir o futuro e evitar a morte. Paramos de beber isso, comer aquilo, fazer isso ou aquilo. Tentamos evitar as doenças e fazemos exames preventivos para quase tudo. Então, de repente, a morte chega em um redemoinho por baixo do rio calmo.
De alguma forma, vale a pena viver o dia e deixar-se surpreender pela morte. A vida muda de repente. De uma hora pra outra, o que era muito bom e essencial já não existe mais e temos que nos reinventar. Há também momentos em que o que era ruim e deprimente já não tem mais sentido e somos surpreendidos pela alegria.

Nós somos básicos e ao mesmo tempo complexos como as razões para viver ou morrer. Talvez o que nos reste seja dignificar esse breve intervalo em que temos a oportunidade de ouvir nosso coração bater e encher nossos pulmões de ar.